segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Duplas


Fotos: Flávio Dutra, Mercado Público de Porto Alegre

Coisa boa de feriado em casa é ler os jornais guardados "pra depois", juntar tralha que tava atrapalhando no "quartinho de estudar" e jogar fora e, de quebra, achar coisas semi-perdidas.
Nessas, encontrei uma pilha de revistas de fotografia prontas pra irem pro lixo e que, pra mim, tavam na mira do "um dia leio". D. Maria, a faxineira, parece que não tava mais acreditando nisso e tinha intenções menos nobres e mais realistas.
Buenas, salvei tudo (D. Maria vai ficar brava!) e, folheando uma que outra, encontrei esse texto aí de baixo. Talvez seja mesmo um pouco "romântico", mas tem coisa melhor?
Eu que digitei, o que significa que eventuais erros são meus e não da revista.


Dupla de dois, simples como feijão e arroz

Por Xico Sá*

Noves fora a nostalgia precoce, essa doença que nos pega com frequência, feito vírus de gripe, uma coisa é certa: a reportagem no Brasil está sentindo falta da parelha, do casal de pombos da notícia, a velha dupla repórter/fotógrafo, os xifópagos que fazem miséria quando estão na liga.Não estou aqui falando tão-somente de duplas de grife, tipo David Nasser & Jean Manzon da Cruzeiro dos velhos tempos. Trato da necessidade de fotógrafo e repórter andarem juntos, unha e carne, tocando de ouvido, entrosados, tabelinha de idéias, cerveja no boteco e... pimba!, grandes histórias nas páginas.Simples e fácil como empurrar bêbado em ladeira, pena que os jornalões tenham esquecido de prática tão necessária. Agora normalmente é assim: cada um faz a sua parte de maneira isolada. O jornalão manda o repórter, quando manda em viagem, e depois se vira para ilustrar a matéria como pode. Compra de frila, de agência, se vira.Nada contra frilas e agências, mas é incomparável, em reportagens, o rendimento de uma dupla com o resultado desse casório maluco que junta um texto vomitado aqui com uma foto baixada ali conforme foi possível comprá-la. Em alguns casos, você vê a mesma foto, mesmo num acontecimento banal, em todos os jornais. É o fim do princípio básico do jornalismo: o furo, o rombo, o extraordinário.O fim do velho grito "Extra! Extra! Extra", sempre hiperbolicamente rodrigueano e exclamativo no último!!!Aliás, o que mais perturba hoje um editor é a tal da exclusividade. Você repórter vai lá e diz aquele sonoro "SÓ NÓS TEMOS!" O chefe olha, reflete, e diz, burramente: "Então damos depois". O que se busca é o empate. O importante é não tomar furos, jamais dá-los. Se nós temos, o furo vai para as gavetas. Fica à espera para ser desovado num feriadão, um fim de ano, um Corpus Christi, o diabo a quatro...A dupla, nesse caso, é um problema.Um repórter e um fotógrafo trocando figuras, mergulhando no tema, unindo os repertórios de outras histórias é um perigo. Podem fazer misérias!

*Xico Sá, um dos últimos jornalistas românticos, acredita no óbvio: histórias boas gastam muita sola de sapato e são contadas pelas duplas de repórter-fotógrafo.

Texto originalmente publicado na revista Fotosite Fotografia, número 6, jun/jul/2005.


3 comentários:

PhotO disse...

Que querido esse texto! Lindas fotos!!
Realmente faz falta a "dupla", hoje temos que fazer tudo, fotografar, escrever o texto, publicar, diagramar... sem entrega e nem romantismo.
Bjo, boa semana!

Marco A. F. disse...

bacana o texto! acho q tu deve ter visto essa reportagem do JC de Pernambuco http://jc.uol.com.br/canal/cotidiano/pernambuco/noticia/2009/08/29/irmaos-sem-direito-a-brincadeiras-a-luz-do-dia-198084.php
é um bom exemplo de como o trabalho em dupla rende boas matérias...
abração

Félix Zucco disse...

Salve professor Flávio! Baita post, e belas fotos...

Inaugurei meu blog. Dá uma passada lá!

abraços,
Felipe Zuccolotto